Agroecologia: pilar da revolução agrícola em Burkina Faso

Em Koubri, localizada a 40 quilômetros de Uagadugu, capital de Burkina Faso, um grupo de 30 mulheres da Associação Feminina de Watinoma dá início ao seu dia com canto, que marca o princípio do trabalho. Elas cultivam mais de dois hectares utilizando práticas agroecológicas para fornecer alimentos para suas famílias, escolas e mercados locais.

Kafando Wendyaoda, uma das produtoras, compartilha sua experiência: "Cultivo cebola e tomate, e na estação das chuvas, mudo para milho e amendoim." Ela destaca que a renda gerada por seu trabalho ajuda a sustentar sua família e a contribuir com a educação dos filhos. "Comemos de forma saudável e eu mantenho uma boa saúde. Além disso, consigo economizar para outros investimentos", afirma.

A agroecologia se tornou um pilar importante na agricultura de Burkina Faso, especialmente sob o governo de Ibrahim Traoré, que assumiu em 2022. Ele propõe um projeto que busca romper com a herança do colonialismo francês na região. O país se destaca por ter uma Estratégia Nacional para o Desenvolvimento da Agroecologia, com a meta de que 30% das terras agrícolas sejam manejadas de acordo com esses princípios até 2030.

Esse objetivo está sendo desenvolvido em conjunto com organizações populares e associações de agricultores, como a Watinoma e a Associação Yelemani, liderada pela ativista e agroecóloga Blandine Sankara. Essas associações têm lutado contra a presença de multinacionais e a introdução de transgênicos em Burkina Faso.

Soulemane Yougbare, diretor técnico do Conselho Nacional da Agricultura Biológica de Burkina Faso (CNABio), enfatiza a importância das associações nesse contexto. Ele recorda que nos anos 2000, o país enfrentou uma pressão intensa com a introdução de sementes geneticamente modificadas, especialmente no cultivo do algodão. No entanto, a mobilização da sociedade civil gerou resistência, levando as multinacionais a reavaliar suas estratégias.

"Acreditamos que os pequenos agricultores são os que realmente alimentam o país", afirma Yougbare. Ele ressalta que a agroindústria tradicional mostrou suas limitações, e a agroecologia é o caminho viável para garantir segurança alimentar.

Recuperação e sustentabilidade

A recuperação da fertilidade do solo é um dos focos da Associação Watinoma, que foi estabelecida em 2004. As mulheres utilizam fertilizantes naturais, sistemas agroflorestais e biopesticidas para proteger as culturas sem prejudicar o meio ambiente. Um exemplo é o uso de uma mistura feita de folhas de nim, gengibre, alho e pimenta, uma alternativa natural que afasta pragas sem exterminá-las.

Ima Hado, presidente da associação, destaca a conexão com a ancestralidade: "Temos amor pela agroecologia e pela terra. Aprendemos práticas em nossas viagens e adaptamos essas experiências aqui." A associação também venceu o desafio da escassez de água, instalando um reservatório de 15 m³, alimentado por energia solar, que garante o abastecimento durante a estação seca.

"O objetivo é integrar Koubri e os vilarejos vizinhos no caminho agroecológico, resgatando saberes ancestrais para o futuro", complementa Hado.

Desafios climáticos

Burkina Faso, situado na faixa do Sahel, enfrenta sérias dificuldades causadas pelas mudanças climáticas. As temperaturas extremas, que em 2024 chegaram a 45 °C no país e 48,5 °C em Mali, contribuíram para problemas de saúde pública e cortes de energia. Yougbare explica que a combinação de altas temperaturas e degradação dos recursos naturais devido a práticas agrícolas insustentáveis deixou os solos empobrecidos.

A luta atual se concentra em promover o uso de bioinsumos para substituir fertilizantes químicos. Yougbare considera que o governo tem mostrado uma disposição positiva para ouvir essas propostas, mas a implementação ainda é limitada.

Legado de Thomas Sankara

A agroecologia em Burkina Faso tem raízes na visão do líder revolucionário Thomas Sankara, que governou o país de 1983 a 1987. Influenciado por Pierre Rabhi, um proeminente defensor da agroecologia, Sankara focou em práticas sustentáveis e na redistribuição da terra para os pequenos agricultores.

Soulemane Yougbare destaca que após a morte de Sankara, em 1987, as práticas agroecológicas foram gradualmente substituídas por métodos convencionais dominados por interesses externos. Com o regime de Blaise Compaoré, que governou até 2014, práticas tradicionais, como a troca de sementes entre comunidades, acabaram sendo descontinuadas.

"Essa agricultura moderna nos foi imposta, mas não se adapta ao nosso contexto, causando muitos problemas", critica Yougbare.

Atualmente, a reintrodução de políticas agrícolas que respeitem o legado de Sankara é vista com otimismo por muitos, incluindo o agricultor e deputado Mark Gansonré. Ele acredita que, se as atuais políticas se concretizarem, o país pode vislumbrar um futuro mais autossuficiente e produtivo em termos de alimentos saudáveis.