
Na quarta-feira, 25 de outubro, o Congresso Nacional aprovou rapidamente um projeto que revogou o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), anunciado pelo governo Lula na semana anterior. Essa foi a primeira vez em 33 anos que um decreto presidencial foi derrubado pelo Legislativo. Essa situação evidencia a relação de forças entre os Poderes, mostrando que o Executivo se encontra em uma posição desfavorável diante do Congresso.
A votação no Congresso começou com a inclusão do tema na pauta, anunciada pelo presidente da Câmara, Hugo Motta, nas redes sociais na noite de terça-feira, 24. Isso representou uma mudança significativa em relação a um acordo previamente estabelecido com o governo semanas antes.
As votações foram rápidas e não atraíram muitos parlamentares. Na Câmara, o governo sofreu uma grande derrota, conforme descrito por alguns líderes, enquanto no Senado o processo foi simbólico. Ao desconsiderar um acordo e revogar o decreto, a atitude do Congresso revelou mais sobre seus próprios interesses do que sobre a real necessidade da população.
Nos dias seguintes, o governo organizou uma resposta. Na sexta-feira, 27, o partido PSOL entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a derrubada do decreto. Essa ação já havia sido cogitada por membros do governo, incluindo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente Lula. Ao mesmo tempo, o deputado Guilherme Boulos anunciou uma manifestação contra o que chamou de “boicote da direita” no Congresso, popularizando críticas nas redes sociais direcionadas a parlamentares de direita.
A derrubada do IOF é vista por especialistas como um reflexo da luta de classes no Legislativo, onde pautas que favorecem a população são frequentemente ignoradas em favor de interesses de empresários e grupos poderosos. A economista Juliane Furno observa que a luta de classes envolve várias dimensões, incluindo a relação entre capital e trabalho, e atualmente se manifesta principalmente em um conflito sobre a distribuição de recursos e impostos.
Furno explica que a derrota do governo nesta questão revela a correlação de forças no Congresso, onde os interesses dos mais ricos prevalecem. O cientista social Paulo Nicoli Ramirez complementa que a composição do Congresso é fortemente influenciada por interesses empresariais, e muitos parlamentares agem em detrimento da qualidade de vida da população, apoiando somente os interesses das elites.
Um levantamento de 2022 aponta que 84 dos 513 deputados federais também são empresários, representando uma das profissões mais comuns na Câmara, atrás apenas de advogados. Quando legislações beneficiam o empresariado, isso acaba por favorecer também os próprios parlamentares.
A derrubada do IOF ocorreu no mesmo dia em que o Senado decidiu aumentar o número de deputados federais de 513 para 531. Essa mudança foi motivada por uma decisão do STF sobre a redistribuição de cadeiras baseada no último Censo Populacional. Em vez de redistribuir as vagas existentes, o Congresso optou por criar novas, o que, segundo Ramirez, demonstra um desprezo pelo orçamento público e pela redução do déficit.
Embora parlamentares da oposição argumentem que o governo está aumentando impostos para a população, Ramirez ressalta que o IOF afetaria principalmente a classe média e os mais ricos. Apesar dos impactos deste aumento não serem significativos para os ricos, seria uma forma de garantir uma contribuição mínima para o orçamento do país.
Atualmente, o Congresso parece estar mais inclinado a reduzir políticas públicas e benefícios sociais do que a buscar alternativas que taxem de forma mais justa os super-ricos. A impossibilidade de discutir a reforma tributária e outras formas de equalização fiscal reflete a composição do Congresso, que está mais alinhada com interesses econômicos do que com as necessidades do povo.
Para Ramirez, a mudança na representatividade do Congresso só poderá acontecer através das próximas eleições, onde a população terá a oportunidade de escolher representantes que realmente defendam seus interesses, e não apenas os de grupos econômicos. Ele critica a falta de diversidade na Câmara, que deveria ter uma composição mais equilibrada entre gêneros e incluir representantes de diferentes movimentos sociais, e ressalta que os interesses econômicos ainda dominam a política.