Vereador do Recife celebra atraso em curso de medicina para jovens rurais

Vereador do Recife questiona curso de Medicina para população de reforma agrária

Desde o fim de setembro, o vereador Tadeu Calheiros, do MDB, no Recife, iniciou uma mobilização contra a criação de um novo curso de graduação em Medicina, voltado para jovens de áreas de reforma agrária. Este curso, promovido pelo Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) e financiado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, visa oferecer 80 novas vagas no Campus Agreste da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), em Caruaru, sem alterar as regras do processo seletivo convencional.

No dia 30 de setembro, Calheiros conseguiu uma decisão judicial do juiz Ubiratan de Couto Maurício, da 9ª Vara da Justiça Federal, que suspendeu o edital que previa as novas vagas. O vereador argumenta que o edital é “extremamente seletivo” e que isso gera apreensão entre profissionais de saúde, estudantes e a comunidade acadêmica. Em um vídeo, o vereador se manifestou discutindo a possibilidade de anulação do edital.

Essa ação teve apoio de instituições como o Conselho de Medicina de Pernambuco e o Sindicato dos Médicos, mostrando uma forte resistência à iniciativa. Em outro vídeo, Calheiros expressou sua expectativa em ver o edital suspenso e, quem sabe, anulado.

Entretanto, após alguns dias, o desembargador Fernando Braga, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, revogou a suspensão e autorizou a retomada do processo seletivo. Calheiros então buscou outra suspensão, que também foi derrubada.

Mudanças no calendário escolar

Apesar da instabilidade nas decisões judiciais, o vereador registrou um avanço ao celebrar o adiamento das provas para os candidatos. Originalmente marcadas para o dia 12 de outubro, agora serão realizadas no dia 2 de novembro, e a abertura das turmas, inicialmente prevista para 20 de outubro, foi transferida para 2 de dezembro. Esta mudança, segundo Calheiros, possibilita uma análise mais cuidadosa da situação na Justiça.

Junto a uma nota da Federação Médica Brasileira, o vereador criticou o curso do Pronera por conceder “privilégios indevidos” e reiterou que o acesso à educação deve ser igualitário, independente da origem social. O curso visa atender jovens camponeses e quilombolas, muitos dos quais vivem em áreas rurais carentes de serviços de saúde.

Dados de uma pesquisa da Controladoria Geral da União revelam que 73% das famílias rurais têm dificuldade em sobreviver apenas da produção agrícola, dependendo de outras fontes de renda, como aposentadorias ou programas sociais. Além disso, um estudo anterior indicou que a renda média dos assentados rurais é inferior ao salário mínimo.

Contexto do vereador

Tadeu Calheiros está em seu segundo mandato como vereador, tendo sido eleito em 2020 e reeleito em 2024. Formado em Medicina pela Universidade de Pernambuco, ele possui um patrimônio significativo, estimado em R$ 1,46 milhão, segundo seus registros no Tribunal Superior Eleitoral. Além de seus rendimentos médicos, ele recebe R$ 37,8 mil mensais como vereador. Sua crítica à criação do curso de Medicina se baseia na sua visão de que ele privilegia um grupo específico.

Neste contexto, o deputado federal Mendonça Filho, ex-ministro da Educação, se uniu a Calheiros na crítica ao programa de Medicina. Ele declarou que a educação deve proporcionar igualdade de oportunidades para todos, e não apenas para segmentos específicos da população.

Questões sociais e educativas

O diretor do Centro Acadêmico do Agreste, professor Dilson Cavalcanti, avaliou que as críticas à criação do curso estão ligadas à manutenção de privilégios de determinados grupos. Segundo ele, o Pronera é fundamental para oferecer oportunidades educacionais a quem não nasceu em contextos favorecidos. Cavalcanti também observou que a falta de informação sobre o público-alvo do curso é uma questão recorrente.

Durante uma visita a Caruaru, o ex-ministro Márcio Macêdo argumentou que outras áreas já têm acesso a cursos através do Pronera, e indagou por que a Medicina não deveria ter o mesmo tratamento.

A deputada estadual Rosa Amorim, originária de um assentamento, ressaltou a necessidade de médicos nas áreas rurais, apoiando a formação de novos profissionais que ajudarão a suprir essa demanda.

Até o momento, o Pronera já realizou ou está realizando seis cursos em Pernambuco, incluindo formações em áreas como educação e ciências agrárias. Esta é a primeira vez que um curso de Medicina é oferecido pelo programa.

Defesa da UFPE

Alfredo Gomes, reitor da UFPE, defendeu a validade do processo seletivo, destacando que ele segue a legislação vigente e é crucial para democratizar o acesso ao ensino superior. Ele enfatizou que a iniciativa visa formar médicos para atender a população rural, que enfrenta grandes desafios de saúde, e afirmou que a UFPE não se deixará intimidar por críticas.

O edital do curso visa atender uma variedade de perfis, incluindo a população quilombola e pessoas beneficiárias de programas de reforma agrária e crédito rural. A seleção inclui etapas como provas e análise do histórico escolar, contemplando cotas para diferentes grupos.

O que é o Pronera?

O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária foi criado em 1998 com o objetivo de combater as desigualdades no acesso à educação entre a população rural. Ao longo de sua existência, o Pronera já formou mais de 200 mil estudantes, oferecendo oportunidades em diversas áreas de educação para jovens e adultos de áreas de reforma agrária.

Esse programa, segundo o Incra, busca enfrentar as desigualdades históricas que marginalizam a população camponesa e assegurar que todos tenham acesso à educação pública de qualidade.