
A rejeição recente das propostas de reforma para o “Novo Mercado”, da bolsa de valores brasileira, a B3, provocou uma discussão importante sobre a governança corporativa no país. Esse resultado não deve ser visto como um retrocesso, mas sim como uma oportunidade para ajustar as práticas de governança às necessidades reais das empresas.
Das 190 empresas que poderiam votar, 152 participaram da votação. O resultado foi significativo: 49% das empresas rejeitaram todas as 25 propostas apresentadas, 46% aprovaram apenas algumas, e apenas 5% apoiaram o pacote completo. Essa quase unanimidade de insatisfação indica que as propostas não estavam alinhadas com as prioridades atuais do mercado.
As empresas não estão contra a ideia de melhorar a governança, mas sim questionam a maneira como as novas regras foram apresentadas. As propostas eram complexas e apresentadas de forma agrupada, sem espaço para escolhas específicas, em um cenário em que as empresas enfrentam juros altos e baixa liquidez. Com isso, o aumento das exigências regulatorias pareceu oneroso sem benefícios claros.
Manter a adesão ao “Novo Mercado” já implica custos extras em termos de estrutura, compliance e governança. Historicamente, esse investimento era recompensado com melhores condições de acesso ao capital e uma valorização superior. Porém, esse “prêmio” tem diminuído, fazendo com que empresas com boas práticas de governança sejam negociadas a preços mais baixos, enfraquecendo o incentivo a seguir as novas regras.
A resistência das empresas não questiona os princípios da boa governança, mas o formato regulatório que impôs novas obrigações sem o devido equilíbrio de valores. Um dos principais problemas foi o modelo de votação “tudo ou nada”, que dificultou a manifestação de apoio a cláusulas específicas que poderiam ser mais bem recebidas. Após críticas, a decisão de desmembrar as propostas foi um passo positivo, mas pode ter chegado tarde.
Várias questões levantadas nas propostas são importantes, como a limitação do overboarding e o aumento da independência nos conselhos, mas, ao tratar princípios de forma rígida, as propostas acabaram perdendo foco e eficácia.
Esse episódio teve um impacto significativo na reputação do “Novo Mercado”, que sempre foi considerado uma referência de boas práticas de governança. A rejeição das propostas por muitas empresas que já adotam esse modelo gera desconfiança e insegurança em relação à governança corporativa no Brasil. É essencial restaurar essa imagem com um processo mais inclusivo e propósito claro.
Além disso, há um problema estrutural nesse modelo regulatório, que tenta aplicar as mesmas normas a diferentes realidades. Empresas grandes e estabelecidas podem seguir padrões mais rigorosos, mas isso pode ser um fardo desproporcional para empresas menores ou em crescimento. Isso tende a afastar essas companhias, que são essenciais para fomentar o mercado de capitais.
A resistência das pequenas empresas em relação ao “Novo Mercado” se torna mais evidente, já que as novas obrigações significam um custo maior para elas em termos financeiros e operacionais. Quando empresas maiores rejeitam propostas, as menores podem concluir que o “Novo Mercado” não é mais uma opção viável.
Entretanto, esta situação também abre a porta para reformulações mais eficazes. Regras que geram respeito não são necessariamente as mais rígidas, mas aquelas que são construídas em diálogo com o setor. Essa rejeição pode ser vista como uma chance de adotar uma abordagem mais colaborativa na construção de um “Novo Mercado” que atenda melhor às necessidades de todas as empresas, sendo mais equitativo e funcional.
Para seguir em frente, é crucial que o “Novo Mercado” evolua por meio de um método que valorize o diálogo com as empresas, promovendo ajustes que garantam a continuidade e a atratividade no mercado de capitais brasileiro.