
Em 2023 e 2024, a facção criminosa conhecida como PCC (Primeiro Comando da Capital) não apenas ampliou sua atuação, mas também sofisticou suas operações em diversos países. Anteriormente, os membros do grupo fora do Brasil principalmente ofereciam suporte logístico para o tráfico de drogas. Nos últimos dois anos, no entanto, começaram a desenvolver redes de assistência para detentos em outras nações e a criar seus próprios esquemas de tráfico internacional.
Lincoln Gakiya, promotor e coordenador do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público de São Paulo, apresentou essas informações durante um seminário sobre crime organizado e mercados ilícitos. Ele revelou que, até o início do ano passado, havia mais de 40 mil integrantes do PCC espalhados por 28 países, incluindo o Brasil, com um faturamento total estimado em cerca de R$ 1 bilhão por ano.
O PCC identificou novos locais de atuação, como Alemanha, Irlanda, Turquia e Japão, conforme um levantamento recente. A lista dos países foi elaborada com base na interceptação de mensagens entre membros da facção. Gakiya destacou que os próprios criminosos realizam periodicamente um “censo” para mapear a presença do grupo fora do Brasil e determinar quantos membros estão em cada local.
Um levantamento realizado em dezembro de 2023 revelou a presença de 87 membros do PCC em Portugal, dos quais 29 já estavam presos. Esse número representa mais que o dobro em relação a um estudo feito menos de um ano antes, o que preocupa o promotor. Os dados também mostram uma diversificação das funções dentro da facção, com líderes responsáveis por tráfico de drogas, controle de armas e assistência a detentos em prisões masculinas e femininas.
A presença de um chefe do PCC em Portugal sugere que o grupo tem interesse em montar seu próprio esquema de tráfico naquele país, além de simplesmente vender drogas para outras organizações. Gakiya observou que, ao contrário das prisões brasileiras, as penitenciárias em Portugal carecem de serviços de inteligência para monitorar a comunicação dos presos, facilitando a atuação do crime organizado. Essas condições levantam preocupações sobre a expansão criminosa na Europa.
O fortalecimento do PCC também foi observado nos países vizinhos. Na Argentina, um levantamento do Gaeco revelou 56 membros da facção, sendo 26 deles presos, o que denota um crescimento superior a 100% em apenas um ano. Essa expansão inclui a “batização” de estrangeiros, um processo em que indivíduos se tornam oficialmente membros da facção.
Uma das preocupações de Gakiya é a capacidade de o PCC formar parcerias com outras organizações criminosas, mesmo em países com cartéis de drogas estabelecidos, através de cooperação comercial e sem recorrer a conflitos violentos. Um exemplo dessa colaboração internacional foi a apreensão, em março, de um submersível com 6,5 toneladas de cocaína próximo aos Açores, que tinha em sua tripulação brasileiros, um colombiano e um espanhol. O submersível teria saído do Amapá.
O Gaeco também recebeu informações sobre tentativas de abrir novas rotas para o tráfico de cocaína, desta vez via Caribe. O traficante Marcos Roberto de Almeida, conhecido como Tuta, teria passado pela República Dominicana e pelo Panamá, o que levanta indícios sobre a nova estratégia do PCC. Tuta, que era considerado um dos principais líderes do PCC em liberdade, foi preso na Bolívia no mês passado, e investigações indicam a presença de outras lideranças do grupo no país.