Marco temporal e agronegócio: conflito nas terras indígenas, diz antropóloga

O debate sobre o marco temporal e a influência do agronegócio nas terras indígenas está gerando crescente tensão e violência. A antropóloga Lúcia Helena Rangel, assessora do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), compara a situação a um cenário de guerra, onde milícias armadas atacam comunidades indígenas. De acordo com o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas, divulgado recentemente, 211 indígenas foram assassinados em 2023, o que reforça a gravidade do problema.

Rangel denuncia que práticas brutais contra povos originários permanecem comuns no país. Ela menciona casos alarmantes, como o de dois meninos que foram marcados a ferro, lembrando que a situação não tem melhorado. “A maldade e a violência parecem não ter fim”, afirma.

Segundo a antropóloga, o agronegócio é um dos principais fatores por trás das invasões de terras, com casos mais frequentes em estados como Roraima, Amazonas e Mato Grosso do Sul. Rangel destaca que, apesar de já haver extensas áreas plantadas, ainda há uma pressão por mais terras, frequentemente às custas dos territórios indígenas.

A recente aprovação da Lei 14.701, que estabelece o marco temporal, também tem gerado controvérsia. Rangel argumenta que essa lei é uma “ficção” criada para permitir a ocupação de terras indígenas. Para ela, o marco temporal não resolveu os conflitos, mas aumentou a violência, com invasores utilizando tratores e armamento pesado.

A criação de uma câmara de conciliação pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi criticada por Rangel, que diz que esse mecanismo apenas aumenta a insegurança nas terras indígenas. “Parece que a intenção é piorar a situação, retirando direitos e intensificando as violações”, afirma.

A situação é ainda mais preocupante com o avanço do “PL da Devastação”, que pode facilitar a mineração e a exploração econômica em terras indígenas. Rangel alerta que essa proposta, aprovada recentemente, abre as portas para atividades que priorizam o lucro imediato, sem considerar os benefícios para as populações locais. O relatório do Cimi destaca que os povos indígenas isolados também enfrentam riscos crescentes, com 119 registros de ameaças na Amazônia Legal. Essa exploração descontrolada torna cada vez mais difícil a proteção das terras e das comunidades que nelas habitam.