
Explorando "Dom Casmurro": Conflitos e Contrastes na Obra de Machado de Assis
Nesta leitura de “Dom Casmurro”, o famoso romance de Machado de Assis, publicado em 1900, encontramos a história de Bentinho, um homem que narra suas memórias e reflexões sobre sua vida e seus relacionamentos. Desde a infância, onde foi criado por sua mãe, dona Glória, Bentinho viveu uma vida marcada pela proteção e a rotina previsível. No entanto, essa história muda quando Capitu, uma jovem cheia de vida, entra em sua existência.
O romance é narrado em primeira pessoa, o que nos permite conhecer a perspectiva de Bentinho, que já possui uma carreira como advogado. Ele e Capitu se apaixonam na adolescência e sonham em se casar. Entretanto, as relações sociais e os níveis econômicos das duas famílias revelam contrastes importantes na narrativa. A família Santiago, de Bentinho, é mais abastada, enquanto a família Pádua, de Capitu, enfrenta dificuldades financeiras. Dona Glória, ao ficar viúva, vende a fazenda e os escravos que possuía, investindo em propriedades e títulos, enquanto o pai de Capitu passa por um momento de instabilidade em seu emprego, o que marca a queda de seu status.
Dentre esses conflitos, um destaque é dado à relação entre Bentinho e Capitu, que começa de forma amigável, mas que se torna complexa. A interação entre José Dias, um agregado da família Santiago, e o pai de Capitu é um exemplo da rivalidade crescente entre os personagens, que passa de um riso inicial para um antagonismo mais sério ao longo da história.
Um aspecto notável do romance é o uso da linguagem pelo narrador. Bentinho, ao relembrar sua amizade com Capitu, a descreve de maneira singular, afirmando que ela é “mais mulher do que eu era homem”. Essa frase traz à tona a complexidade da personagem feminina, que, mesmo convivendo com as expectativas da sociedade e as inseguranças do marido, mantém uma postura digna.
Bentinho é um personagem marcado pelo ciúme, o que provoca um distanciamento emocional em seu casamento com Capitu. Mesmo com uma formação privilegiada e uma carreira de sucesso, ele se deixa levar pela desconfiança, questionando a fidelidade da esposa. Quando ela tenta se defender de suas acusações, demonstra um autocontrole admirável, em contraste com a obsessão de Bentinho em provar sua deslealdade.
Um momento crucial na narrativa decorre de um julgamento interno de Bentinho sobre o olhar de Capitu, que é influenciado pela opinião de José Dias. Ele se lembra dos “olhos de cigana oblíqua e dissimulada”, uma descrição que contribui para semear dúvidas em sua mente. Mesmo ao observar Capitu, Bentinho não consegue ver a verdade em sua inocência, mergulhando em sua própria insegurança.
A história avança, e a trama revela ainda mais habilidades de Capitu, que construía conversas com habilidade. Bentinho, por outro lado, mostra-se incapaz de perdoar, mesmo após os anos passarem. Em suas interações com o filho Ezequiel, fica evidente seu distanciamento emocional. Ele o faz esperar intencionalmente, mostrando sua manipulação e controle sobre a situação.
A obra evidencia o contraste entre Capitu e Bentinho. Enquanto ela se comporta com dignidade e equilíbrio, ele se torna cada vez mais amargo e cínico. O romance culmina em uma série de desilusões e questionamentos, levando o leitor a refletir sobre o que é verdadeiro e o que é ilusão nas relações humanas.
Através destes conflitos e tensões, “Dom Casmurro” se torna uma obra atemporal que explora não apenas relações pessoais, mas também as complexidades da condição humana, evidenciando que as aparências e julgamentos podem distorcer a realidade. A leitura nos convida a enxergar além das superfícies, questionando a natureza do amor, da ciúme e da verdade.

